Com o fim do Pan-Americano, algumas instalações construídas especialmente para os Jogos estão agora abrigando grandes shows na cidade do Rio de Janeiro. Uma delas é a Arena Olímpica do Rio (Rio Arena) - uma arena multiuso que, no último dia 8 de Março, recebeu o homem que deixou Elvis com inveja, teve Lennon como grande fã e fez da gaita seu instrumento marcante: Bob Dylan.
Antes do show em solo carioca, porém, Bob fez duas apresentações em São Paulo. Fico espantado ao ler, na internet, tantas notas e resenhas falando mal de ambos os concertos. Algumas, inclusive, acusam o artista de hoje em dia ser uma "mera caricatura de si mesmo." Eu, como grande fã de Dylan, já havia comprado meu ingresso (o mais barato e com direito a meia-entrada - foi o que minhas aulas particulares permitiram). Que me perdoem meus amigos(?) paulistas. Não sei o que aconteceu em Sampa - se a banda não estava inspirada ou se Dylan não se sentiu confortável (o que não deve ter sido verdade pois, reza a lenda, antes de chegar ao Via Funchal, ele teria saído do carro e ido até o camarim a pé, andando entre a galera como um simples mortal que ele não é). O fato é que no Rio,
things have changed. As pessoas ainda procuravam um bom lugar para assistir ao show quando uma música clássica que eu não sei o nome (perdoem minha ignorância) toma conta do ambiente, como se nos avisasse que o grande momento estava perto. Uns cinco minutos depois, a tal música clássica pára e, ao mesmo tempo, as luzes são apagadas. O escuro só não é completo por causa dos flashes que pipocam sem parar. Quem olha para o palco religiosamente, percebe os músicos tomando suas posições. Robert Zimmerman está lá: chapéu preto, paletó cinza, çalça e sapatos pretos. Com sua banda "mafiosa" (todos vestidos de preto), ataca logo de cara com "Rainy day woman #12 & 35". A voz é rouca e a canção é mais falada do que cantada. Sim, é Bob Dylan.
A cada fim de música, o palco fica em total escuridão. Dylan sente cada canção. Vai no embalo, seja mexendo a cabeça ou as pernas. Mais que isto: parece pouco se importar com o passado e mostra que não parou no tempo. Prova disto são as ótimas canções de seu atual trabalho, "Modern Times" - "The leeve's gonna break", por exemplo. Já clássicos como "It ain't me be", "Masters of war", "Things have changed", "My back pages" e "Highway 61 Revisited", ou ganham um novo acompanhamento da banda, ou ganham uma nova forma de cantar (ou sussurrar?) de Dylan, tornado quase impossível acompanhá-lo.
O público também merece um destaque especial. Dividida entre a reverência e a perplexidade, a platéia encara o desafio de cantar com o ídolo. Em vão. Resta o prazer em ouví-lo. Sentadinhos, os presentes acompanham as músicas com palmas, outras vezes batem um dos pés e fingem ser o baterista de Dylan. Somente na penúltima canção da primeira parte do show, "Summer days", os Vips foram liberados a ficar pertinho do palco, pulando, gritando e acenando para Dylan. "Like a rolling stone" veio em seguida. Todos cantam a versão imortalizada enquanto Dylan improvisa a linha vocal. Não lembro de ter cantado recentemente o refrão de uma música com tanta vontade quanto aquele.
A banda sai. A galera pede, clama por Bob. Um pouco acima de mim, percebo três amigos se juntarem, usando a luz de seus celulares, para cantar "Blowin' in the wind". Alguns minutos depois, ele está de volta. Toca "Thunder on the mountain", cheia de improvisos. Por fim, "Blowin' in the wind" surge. O público quer cantar. Mas a melodia original é trocada por uma levada mais lenta, nem por isso menos aplaudida. Apesar do "conflito", a noite acaba com palmas entusiasmadas.
Saindo do Rio Arena, vejo Frejat (fã declarado de Dylan). Pergunto ao vocalista do Barão Vermelho o que achara do show. "Olha, eu gostei", disse com aquela cara de quem também não sabia o que havia acontecido em São Paulo. Ali, já não importava. As pessoas se indagavam, sim, se Dylan voltaria algum dia. The answer, my friend, is blowin' in the wind.